Blog Andando por Aí

Fim de ano

final4Pé da Cascata do Caracol, um lugar especial

Quando um ano vai terminando, como este 2023, faço uma análise do que aconteceu nos meses anteriores para ver se fiz ou não fiz o que previra lá no início. Uma coisa instintiva, meio inútil, mas faço. Pois vamos ver o que se passou.

  • 2023 iniciou com a euforia da venda do meu último livro “Um ano no topo do Rio Grande”, lançado no final de 2022, e a boa repercussão que vi e senti em relação à obra. Foi muito bom ver que as pessoas gostaram e procuraram por ela e pouco antes de terminar o ano, esgotou a edição.
  • Passei grande parte do ano trabalhando para finalizar outro livro sobre a natureza de São José dos Ausentes, intitulado “O Vale do rio Silveira”. Trata-se de uma coletânea de fotos originais e crônicas descrevendo o que vi pelo vale, da nascente até a foz. O lançamento deverá ocorrer no outono vindouro.
  • finalCasal de socó-dorminhoco
  • Iniciei outro trabalho interessante e desafiador que intitulei “A história natural do vale da Lageana”, este aqui em Canela. Retratar o natural é uma das minhas atividades preferidas e o material acumulado já é grande. Este livro deverá chegar ao público entre o outono e o inverno de 2024.
  • Com a de hoje, foram 48 crônicas inéditas produzidas para o Jornal Nova Época e para o meu site pessoal. Conto histórias de diversos assuntos e lugares, com ilustrações originais que amparam o leitor para melhor compreensão dos textos. Sempre trabalhei com a fala amparada na imagem na época em que ministrava minhas aulas e agora, igualmente, trabalho com a escrita ancorada nela. Continuo, pois, com o mesmo cacoete didático.

final3O aço e a teia medindo forças

  • Cheguei aos 72 anos, viajei, bebi vinho, namorei, curti minha neta Gaia, revi e convivi com amigos, conversei, fiz fogueira, plantei e colhi alface, abracei e beijei meus filhos Bruna e João Pedro. Cozinhei para os da casa e amigos, dormi muitas sestas, fiz Pilates, caminhei pela cidade cedo pela manhã, fotografei e postei as coisas bonitas que vi pelas nossas ruas. Visitei muitas vezes meus amigos da Estância Tio Tonho e da Pousada Monte Negro, em São José dos Ausentes. Tomei muitos cafés da manhã no bar do Xerox, onde sempre reencontro os amigos, li novos livros e reli O Tempo e o Vento, este pela terceira vez. Escrevi, escrevi, escrevi e aprendi muito.

final2Um dos tantos lugares que utilizei para escrever

  • Este é o resumo do meu ano que termina em breve. Para o próximo? Bom, aí vamos deixar o tempo andar e conto só no final, se estiver por lá. Um abraço a todos, obrigado por me acompanharem por aqui nas minhas gauderiadas literárias. Não vou prometer nada, apenas dizer que em janeiro estarei de férias do jornal. Retorno em fevereiro.

 

A eterna luta das forças opostas

 

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Cordilheira do Andes em El Chalten, Argentina

Se você fica surpreso ao saber que uma luta pode durar um, dez ou cinquenta anos, como as guerras entre nações, disputas diplomáticas por divisas de territórios ou uma diferença entre o valor de uma herança, isso não é nada se comparado ao embate que se trava no planeta desde que ele existe. Nele há duas forças que atuam de forma antagônica, e são vistas e sentidas por nós quase que diariamente.

O vento, o sal e a história

 sal1Fachada com marcos de porta feitos em granito

Há um tempo atrás estive em São José do Norte, no sul do Estado, naquela estreita faixa de areia ladeada pelo oceano Atlântico e a Lagoa dos Patos. Local de planura, história, água, vento e sal ali se instalou, a partir de 1725, um Posto de Vigilância para garantir a posse e o domínio da entrada da lagoa. Surgia ali uma povoação pioneira no início da colonização do Rio Grande do Sul, ora dominada pelos portugueses, ora pelos espanhóis. Ponto estratégico, por ficar no lado norte da barra da lagoa, por onde era escoada a produção agrícola e pecuária dos primórdios da formação do território gaúcho. No lado sul desta mesma barra, formou-se outro povoado que se transformaria no município de Rio Grande. Assim, frente a frente, os dois núcleos urbanos assistiam ao entrar e sair de barcos e navios trazendo e levando coisas e gentes para o interior do insipiente Continente. Andar pelas ruelas centrais de São José do Norte é andar pela história, por um passado não muito distante e que assistiu guerras e revoltas, saques e ataques de todos os tipos no início da sua implantação.

Eu sou o tempo

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É difícil me definir. Sou etéreo, intangível, sem corpo, forma, cor, cheiro, gosto ou textura. Estou aqui pelo mundo desde que ele existe sendo, portanto, contemporâneo a sua criação. Vejo tudo com calma, já que este é o meu maior predicado. A calma. Nunca me apresso, atropelo ou acelero algum acontecimento. Sempre no meu ritmo, as coisas vão seguindo e eu acompanhando. Sou velho e novo, já que estou sempre por aí. Acompanhei o surgimento deste planeta e todas as suas modificações, que não foram poucas, e me sinto plenamente capaz de seguir acompanhando o que virá.

Lua cheia no campo e na cidade

lua cheia

Um dia destes fiquei observando a chegada da lua cheia aqui, em Canela. Sentado na área e olhando para o leste, observava as luzes dos postes da rua à frente que pareciam luares em fila, porém estacionárias, frias. Logo que escureceu mais, vi surgir aquele brilho alaranjado por detrás da folhagem escura de um grande cedro-rosa que tem no terreno do vizinho. Pouco a pouco, entre taças de vinho e conversas, observei que aquela bola, ao contrário das luminárias da rua, vinha subindo e brilhando cada vez mais, passando do alaranjado inicial para um prateado intenso. Em pouco tempo ultrapassou as luminárias, a fiação dos postes, o cedro-rosa e se impôs no fundo escuro do céu, soberana e brilhante tendo como concorrentes poucos pontinhos luminosos de estrelas distantes.

Vendo e ouvindo

Vendo

Gosto de ir a algum lugar remoto onde a paisagem me remete à ausência de rastros humanos ou, pelo menos, com o menor indício de sua presença. Estou agora num destes lugares que escolhi a dedo, tendo à frente o horizonte norte e um mar verde de campos nativos com uma mistura equilibrada de capões de matas de araucária. Os matizes de verde impressionam porque variam entre o escuro e o claro, gradações que mostram o vigor dos campos de primavera e a soberania escura das araucárias que se impõe nas matas. Este equilíbrio de tons verdes dá, à paisagem, um toque de artista, de pintor de quadros que transcreve, fielmente, as cores que vê. Pinceladas de sombras escuras se projetam no chão dos capões abertos, revelando a posição do sol no momento.

Eu sou o esgoto

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É por aqui que eu escapo e me espalho nas calçadas e ruas, quando meus canos entopem

Na visão dos homens, sou repugnante, viscoso, fedorento, escuro e ando sempre, ou quase, pelos buracos e canos sob o solo das cidades, local onde sou mais famoso e abundante. Todos me evitam e sou tratado como um refugo, mas são eles mesmos que me produzem. Surjo como um indesejado e descartável subproduto dos corpos humanos, já que saio das células através dos seus intestinos, bexigas, narinas, da pele lavada nos banhos, das roupas e louças de suas refeições. Tudo acaba se encontrando nas fossas ou nos canos que me levam para as estações de tratamento, ou não, e me transformo num medonho líquido fétido que ninguém suporta ver e cheirar, causando muito transtorno nas cidades que ainda não aprenderam a me tratar adequadamente.

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