Blog Nascentes do Rio Uruguai

Rio das Contas

Ponte sobre o Rio das Contas, no Passo da Barroca. A pequena casa, no outro lado do rio, é o posto de controle fiscal 

Falar no rio Uruguai sem fazer uma referência ao Rio das Contas, é como falar do Rio Amazonas sem citar o Rio Solimões, ou do Rio Jacuí sem aludir ao Caí, ou ao Taquari-Antas. Aqui em São José dos Ausentes serpenteia entre campos, canhadas e matas, fazendo a divisa com Santa Catarina, este pouco conhecido rio das Contas, que ganhou este nome em função de ser num passo dele que se fazia a contagem de gado e cavalos que cruzavam os estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, para efeito de pagamento de impostos.

Rio largo, água limpa, fundo escuro emprestado pelas negras pedras de basalto, mataria abundante nas margens e campos dobrados nos costados tem a grande responsabilidade de ser o divisor entre os dois estados sulinos. No Passo da Barroca, depois da ponte, tem um posto de controle sanitário e fiscal que continua “contando” tudo que passa por ali. Ponte antiga, cansada de segurar os passantes, mostra o desgaste nas suas tábuas já polidas e esfarrapadas. Muitos cascos e pneus gastaram o revestimento que, além de permitir o ir e vir, ainda conta, nas suas fissuras e desgastes, o que o tempo faz com quem se expõe ao atrito dos passantes e do tempo, este último sendo o mais inclemente, persistente e severo corrosivo existente. Ponte com muita história.

Ponte sobre o Rio das Contas, com suas tábuas desgastadas e muita história nas frestas e fibras. Ao fundo o posto de fiscalização de Santa Catarina

Andando pela margem percebo o potencial deste rio que ora se afunda em escuras águas parecendo um lago longo e sereno, ora se expande sobre um leito rochoso que aflora e obriga o rio a correr espalhado formando corredeiras e pequenas cachoeiras. Nestes locais vejo a pureza e transparência da água que me diz da proximidade de suas nascentes que se escondem nas matas e banhados a montante, não muito distante.

Rio das Contas, a montande da ponte da Barroca, com águas mais profundas e a mataria nativa da encosta

A mataria que protege as margens garante proteção ao rio e abrigo a uma grande quantidade de espécies da fauna nativa da região, além de guardar uma diversidade de plantas de todos os tipos, tamanhos e formas. É a riqueza destas matas que me encanta e intriga ao mesmo tempo. Encanta por saber ainda existirem locais assim, tão preservados e muito próximo daquilo que havia aqui antes da chegada dos colonizadores e madeireiros sendo verdadeiros bancos genéticos; intriga por que me pergunto quanto tempo ainda as pessoas poderão usufruir de um local como este, um verdadeiro portal do tempo, fazendo com que se volte duzentos anos atrás e se reconstrua a história, bastando abstrair do local o meu carro branco, a ponte e a casa pintada que representa o controle de quem e o que vai e vem de um lado a outro.

Rio das Contas, a jusante da ponte da Barroca, mostrando o leito rochoso e as corredeiras que se formam. A densa mata de araucária nas margens atesta o grau de preservação do local

Retorno para a Estância Tio Tonho feliz e um pouco intrigado com o que vi no Passo da Barroca. Senti muito forte e claramente a história se evolando daquelas tábuas gastas e pilares de pedras polidas pelo açoite constante das águas claras. Lembro de ter olhado para o rio abaixo da ponte e ver a água correndo com a pressa que o declive do terreno lhe impõe, e fico tentando unir este ponto com a foz do rio Uruguai, lá no rio da Prata em território uruguaio. Imagino uma longa e sinuosa linha prateada cortando o Rio Grande passando sob inúmeras outras pontes, cada vez maiores e mais sólidas, e penso que cada uma, a seu modo, tem histórias para contar como esta simples e gasta ponte do passo da Barroca, muito perto de onde nasce o grande rio. (Segue na próxima semana)

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