Blog A Borda

Amanhecendo na Borda

Sol surgindo por detrás da Borda do cânion do Funil, em S. J. dos Ausentes

Ver o sol surgir numa madrugada limpa ou com algumas nuvens, em lugar privilegiado com a Borda, é um dos espetáculos mais fascinantes que conheço, só comparável ao acompanhamento das pinturas do ocaso, em algumas circunstâncias. Mas o nascimento do dia é diferente, mais emocionante e excitante por que ele espanta a noite, já cansada de escurecer a terra. Aqui na Borda eu acordo com o dia, sempre antes do sol quando já tem aquela claridade sutil vindo do leste e que mostra um pouco só da paisagem e das coisas. A janela do quarto fica sempre aberta e a luz é o meu despertador. Quando o tempo está bom por aqui, amanhece com aquela barra alaranjada no horizonte, lá para os lados de Santa Catarina e do Oceano Atlântico, mostrando ainda as luzes de cidades do litoral, como Araranguá, Morro dos Conventos e outras menores que não reconheço. Aqui em cima o campo ainda está quase em preto e branco, meio dormindo ainda pela débil luz, mas já se divisam as coxilhas onduladas, os paredões do Cânion da Coxilha, algumas cabeças de gado que pastam tranquilas na segurança do rebanho, soltas na imensidão do lugar.

Amanhecendo com a visão do litoral sul de Santa Catarina, na altura de Araranguá

Aos poucos a borda alaranjada se esmaece e, bem a esquerda do container, sobre uma coxilha do final do cânion do Funil, intensifica-se a luz como se um incêndio ali ocorresse. Não demora e surge o sol trazendo uma abundante luz dourada que se espalha por todos os lados, devolvendo as cores e o calor para a Borda. O espetáculo é único, sempre diferente por que quando tem algumas nuvens, ou se o céu está limpo, o cenário se desenha de formas próprias e com o passar dos dias, pelo movimento da terra e o final do verão, o sol vai nascendo cada vez mais para o norte e se enquadrando sempre em um lugar diferente na Borda. Assim que se expõem por inteiro, sua cor passa de laranja para brilhante intenso, branco, forte e quente renovando a vida diurna na paisagem, já cansada da escuridão. A fotossíntese recomeça, o pasto se oferece aos pastadores e ao deleite de quem só observa. Assim recomeça um dia de sol por aqui.

Pouco antes do surgimento do sol, o céu se pinta para receber o astro

Aos poucos vão surgindo os personagens diurnos do lugar que, assim como eu, dormiram à noite. Os tico-ticos desfilam na frente da área a procura de grãos; um casal de sabiá-do-campo se apresenta catando algum inseto pelo chão; um pequeno bando de tico-tico-das-taquaras voa para o mato abaixo, sempre emitindo seus sons característicos; os caranchos emergem do campo e começam sua ronda atrás de carniça ou de algum pequeno animal; as seriemas gritam e desfilam no campo a frente, ariscas e desconfiadas, procurando insetos e pequenos animais; os urubus-de-cabeça-preta iniciam seus sobrevoos planados, ganhando altura com as correntes quentes que sobem dos paredões do cânion; os gaviões-carrapateiros e os falcões quiri-quiris voam a procura de seus alimentos; os rebanhos de gado se movimentam pelo pasto atrás do melhor capim; o vento sopra e canta seu canto envolvente, espantando um pouco os insetos e o calor; a visão da planície e do litoral fica mais definida podendo mostrar o oceano.

 

 O dia, em fim, inicia e promete ser dos bons, sem cerração e eu me animo a preparar uma refeição para distrair o estômago, já cheio de água quente e erva mate. Ovos cozidos temperados com sal, pimenta e azeite de oliva, pão e algumas castanhas de caju. Assim me considero pronto para sair e explorar algum lugar novo até por volta de onze horas, quando retorno, escapando do sol forte.

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