Blog A Borda

O céu da Borda

Céu pintado para um nascer de dia, aqui na Borda.

Ver diariamente um céu que se exibe inteiro de horizonte a horizonte, as vezes vestido de branco, cinza ou preto, as vezes de um azul impecável, de canto a canto, é uma das tantas coisas prazerosas aqui da Borda. Dá para perceber quando o temporal se arma lá do sul e vem cavalgando pelo ar com suas nuvens carregadas, escuras e pesadas; dá para ver quando o tempo vira do leste e traz lá do Oceano Atlântico a umidade que vem sob a forma de nuvens e cerração, pronta para se despejar por aqui; é fácil ver o fenômeno que se arma do oeste, com rajadas de vento e nuvens grossas vindas do continente, trazendo chuva e frio; encanto-me com o fascinante nascer do sol que se desenha todos os dias no horizonte leste, vindo do litoral aquela barra alaranjada que antecede a chegada do sol; hipnotizo-me com o crepúsculo, desenhado num horizonte marcado por coxilhas bordadas de araucárias e o céu se pintando de vários tons de uma cor alaranjada que dá vontade de pegar e guardar; alucino-me com o céu noturno, quando limpo, exibindo seu manto bordado por milhares de pontos estrelares que cintilam e se movem ilusoriamente, de forma lenta, marcando o avanço das horas e o movimento da terra.

Ter sempre a frente um céu assim me torna viciado em horizonte amplo, como já vi muito no Pampa, na Lagoa do Peixe e no Taim. É o domínio do azul, o domínio da abóboda e a certeza de o quanto sou pequeno frente ao universo, o quanto sou insignificante e ignorante das suas coisas e fenômenos. Assistir uma formação de nuvens ligeiras, brancas e encaracoladas se formando e vagando pelo azul, é um exercício fascinante de imaginação e de visões abstratas de coisas que se formam e deformam a medida que os blocos de nuvens são tocados pelo vento. Cavalos, rostos, casas, serpentes, cachorros e um mundo de coisas que vão se formando, aparecendo e mutando, como se fosse um filme animado e sem som que vai passando e deixando que cada observador faça a sua interpretação daquilo que vê e sente. Montanhas assustadoras, rabiscos, rabos de galo, pinturas de parede suaves, flocos e um sem número de formas vão desfilando e encantando, até que, sem muito aviso, tudo se fecha, tudo fica cinza chumbo, carregado, riscos de raios distantes aparecem, sons de trovoadas são ouvidos e, não demora muito, a chuva chega e brinda tudo com seu espocar de gotas que vão distribuindo a água de forma equânime pelos campos e matas da borda.

Céu com nuvens de bom tempo

Habituei-me a ver e a conviver com o céu amplo e infinito daqui da Borda e, quando volto para casa, percebo como ele me faz falta, tanto para acalmar o meu espírito aventureiro como para o simples deleite de vê-lo. Aqui em Canela, pela topografia e construções urbanas, o céu se limita a fragmentos, a parcelas que mal me contam de como está mesmo o domo azul que tanto via na Borda. Espio, me desloco e procuro janelas no céu, entre prédios e árvores, para ver a condição do tempo, encontrar a lua cheia, as Três Marias ou o Cruzeiro do Sul e percebo que a oferta de coisas e luzes da cidade ofuscam a beleza ancestral e atávica do firmamento, coisa que só percebo quando me encontro em lugares como a Borda, o Pampa ou o Litoral que me mostram o verdadeiro tamanho e os mistérios do céu, que são subtraídos quase integralmente de quem vive na cidade.

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