Blog A Borda

Temporal na Borda

Chuvarada despejando na planíecie costeira de Santa Catarina, apreciada daqui da Borda. 

A primeira chuva forte que peguei aqui na Borda, não vou esquecer tão fácil. Era um dia de sol pleno, manhã limpa e com boa visibilidade no cânion. No meio da tarde a coisa começou a mudar e uma montanha de nuvens escuras, vindo do leste, cobriu o azul do céu e parecia uma cordilheira que subia mais alto que o planalto, emparedando toda a borda, escondendo o litoral. Em seguida mais nuvens vieram do oeste e taparam de vez o céu, trazendo vento e uma friagem ligeira. Não tardou para o temporal iniciar lá no litoral e o espetáculo foi sinistro e maravilhoso ao mesmo tempo. Sinistro pela coloração escura, ameaçadora e intimidadora da massa de nuvens e maravilhoso quando iniciou o despejo da água em magotes que eu conseguia ver daqui, do poleiro da Borda. Pensei que era bom assistir uma manga de água caindo longe e os raios riscando o céu cor de chumbo sujo. Fiquei assim olhando e fotografando o evento quando os raios começaram a estourar mais para perto da borda, mais para perto de casa. Foi quando ouvi um estouro ensurdecedor, que me deu um cagaço sem tamanho, parecendo coisas quebrando. Foi rápido como um raio – daí o dito popular. Estourou e o silêncio que se seguiu foi utilizado para eu sentir se tinha e sido atingido o container ou o mato próximo. Felizmente não foi no container e não consegui descobrir aonde que o mandado caiu. Em seguida veio a chuva, forte e constante que molhava o campo com gosto, enchendo banhados, açudes e arroios. O gado, impassível, continuava pastando e andando.

Antes da chuva forte, o tempo se armou escuro e ameaçador. 

Não demorou muito e, o que eu temia, aconteceu. A energia elétrica foi cortada sem aviso, sem mesmo piscar uma ou duas vezes. Como o container fica no final de uma rede, e longe de tudo, resolvi esperar pelo restabelecimento sem nada a fazer. Verifiquei a caixa de disjuntor no poste e vi que estava armado. Não era ali o problema. Veio a noite e aí lembrei que não tinha trazido o Vagalume, meu kit de energia solar que me proporcionaria luz por um bom tempo. Resignado, acendi uma vela e liguei o notebook, que tinha sua bateria carregada 100%, o que me permitiu registrar este e outros fatos que serão relatados mais adiante. Na foto que fiz da mesa de trabalho, é possível ver as luzes das cidades do litoral de Santa Catarina, na região de Araranguá, já que por lá a chuva havia cessado e o tempo já estava limpo. Chovia aqui no planalto, mas a atmosfera no litoral estava limpa.  Fiquei assim trabalhando embalado pela luz da vela e do fogo da lareira, escrevendo e tomando um vinho até a hora de dormir, na esperança que a energia voltasse até o amanhecer. Mas não voltou.

Pelas cinco da manhã, com a luz do dia entrando pela janela do quarto, levantei e fui apreciar o nascer do dia mateando e ouvindo a Nevasca FM através do meu rádio portátil, quando fiquei sabendo do forte temporal que assolou a região toda do planalto caindo, inclusive, granizo nas áreas em que a colheita da maçã está em plena atividade. Pensei no prejuízo dos produtores, na impotência que se fica diante de um fenômeno tão intenso e tão espetacular que é um temporal na Borda, restando apenas sentar, apreciar e registrar. Saí atrás de notícias e, como tinha que enviar material para o jornal, resolvi me socorrer nos vizinhos. Fui indo pelas pousadas e estavam todos sem energia. Peguei a estrada e segui para São José dos Ausentes quando passei em frente ao Rincão Comprido, da família Lopes, e resolvi entrar para conferir. Eles tinham energia e internet por que a rede era outra. Salvo pelo gongo e pelo acolhimento desta querida família, consegui enviar o material para o jornal, conversar sobre assuntos aleatórios e ainda comer um bom pedaço de um dos melhores queijos serranos que conheço, feito aqui mesmo pelas hábeis mãos da Dona Maria e da Naira, detentor de prêmios. A energia só foi restabelecida no final da tarde. Coisas de um temporal aqui na Borda.

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